quinta-feira, 5 de janeiro de 2023

Problemas brasileiros cruciais

Diante da análise cuidadosa da atual conjuntura, formulada por um fraterno companheiro, com ênfase para as notícias eivadas de falsidade ou de intenção que objetivem interesses particulares, especialmente, aquelas oriundas daqueles que exploram as redes sociais, de tal sorte a açular negativamente uma parcela bem intencionada da população brasileira, convém agregar valor e oferecer alternativa para a avaliação arquitetada

Deve ser ressaltado que, por críticas infundadas a integrantes da caserna, as ações citadas acabam por estimular a divisão, a derrota da confiabilidade e a perda da coesão entre os militares.

Por via de consequência, é relevante apontar aspectos primaciais da atual conjuntura brasileira.

 

 

Preliminarmente, é oportuno enfatizar que o Brasil tem dois problemas cruciais. Um enorme: o Judiciário. Outro menor: a ocupação do Executivo por uma quadrilha.

No que diz respeito ao Judiciário, há uma avaliação que provavelmente nenhum brasileiro a tenha realizado antes. Examinando-se o perfil de cada um dos integrantes das Suprema Corte dos Estados Unidos e do Reino Unido, e dos Tribunais Constitucionais da Alemanha e da França, constata-se que nenhum deles tem alguma dentre as seguintes “virtudes”:

– reprovação em concurso para juiz; 

– prestação de serviços advocatícios para organização criminosa; 

– prestação de serviços advocatícios para condenado por assassinatos em país democrático;

– permissão para a esposa trabalhar em escritório que lida com causa que pode ser submetida a julgamento na Suprema Corte;

– atividades empresariais incompatíveis com o cargo; 

– difamação de instituições e autoridades brasileiras no exterior; 

– tratamento de questões judiciais fora dos autos do processo; e 

– militância em campanha política de partido responsável pela maior corrupção da história; e 

– descumprimento e conspurcação da Carta Magna com decisões espúrias e inconstitucionais. 

Por certo, Rui Barbosa se assustaria, e mais do que isso, envergonhar-se-ia em dobro, se nosso contemporâneo fosseÉ bom relembrar o que dissera a ‘Águia de Haia’ em célebre oração: 

“... Ao lado da vergonha de mim, tenho pena, tanta pena de ti, povo brasileiro! De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer as injustiças, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto!”

 

 

No que concerne ao Executivo, alguns aspectos devem ser considerados. O primeiro é a constatação de que o candidato vencedor foi tirado do cárcere, onde cumpria sentença a que fora condenado em três instâncias judiciárias, por juiz, três magistrados e cinco ministros, respectivamente, para concorrer à presidência da República, uma das maiores aberrações jurídicas que se tem notícia — não se tem notícia que algo similar tenha ocorrido entre sumérios, assírios, persas, gregos, romanos (o traço de ligação entre a Antiguidade e os tempos atuais), bem como britânicos, americanos, alemães e franceses. 

O aspecto seguinte é a dúvida alicerçada em fatos incontestáveis de que o corrupto ladrão, supostamente vencedor, não teria ganho a eleição — deve ser ressaltado que, com o apoio de ministros, magistrados despojados de ilibada conduta, impediu-se qualquer verificação razoável dos dados da eleição. 

Dos dois primeiros aspectos, decorrem a questão provavelmente mais grave: a falta de iniciativa, desprendimento e coragem de certas lideranças, com fulcro nas militares, para levar avante as medidas saneadoras que convinham e mais do que convir, eram imperiosas.

Por oportuno, cumpre acentuar que as esquerdas passaram décadas tentando dividir, conspurcar e até mesmo desmoralizar os integrantes das instituições militares, e não tiveram sucesso. Da atual omissão de lideranças, resultou êxito naquilo que os oponentes falharam. Ademais, as consequências se estenderam a cidadãos civis apoiadores nossos, dos campos religioso, empresarial e acadêmico, o que significa um balde de falta de confiança na mais confiável parcela da nacionalidade. 

Como avaliação conclusiva, reproduzo agora um texto que divulguei, tentando ser sereno, tranquilo e cuidadoso.

A propósito dos combatentes da Força Expedicionária Brasileira, na Itália, em 1945, cumpre destacar seu papel heroico em defesa da liberdade, ao lutarem com bravura contra o socialismo, isto é, contra o nacional-socialismo [nazismo], irmão siamês do socialismo real [comunismo].

Aqueles que colocam a vida em risco no campo de batalha jamais agem com covardia diante dos riscos oferecidos pelos socialistas, implacáveis oponentes da liberdade.

A propósito daqueles que são favoráveis à investidura de socialistas, notórios e implacáveis corruptos, em elevadas instâncias da República, cumpre asseverar que eles não trocam 20 dias de glória por 20 anos de problemas com os adeptos do socialismo, contudo, fazem a opção por 20 anos de problemas para aqueles que defendem a liberdade.”

Poderia acentuar que eles fazem a opção por 20 anos de retrocesso na evolução social, política e econômica do Brasil. E mais jogam o País e sua enorme população no caminho dos povos cubanos, venezuelanos e, mais recentemente, dos argentinos e chilenos. Jogam o País na maior catástrofe da atualidade global.

Os dois grandes argumentos para a não intervenção — as consequências internas de uma intervenção na realidade brasileira, bem como as consequências externas, especialmente, pressões internacionais insuportáveis — constituem uma visão medíocre. O Irã tem petróleo (que existe em outros lugares) e tem passado por décadas pela respectiva pressão, com terrível embargo; eles têm suportado, mas são de outra índole que os brasileiros. O Brasil alimenta um quinto da humanidade; que venham as hipotéticas pressões e que esse quinto fique com fome, até porque alimento não existe alhures — vale dizer, a hipótese jamais se tornaria realidade. Simples assim!

Minha contundência pode ser uma questão de estilo, mas é também — e sobretudo — resultado de robusta indignação e inconformismo. Por isso não peço desculpas, para não serem confundidas com medo, o que importaria traição ao futuro das próximas gerações (que incluem minhas filhas).

Nesse contexto, não importa se esta visão é virtuosa ou plena de vícios, correta e objetiva ou não, ... em qualquer circunstância, ela se constitui em provocação para desafiar as melhores mentes. 

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terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Problemas para os defensores da liberdade

A propósito dos combatentes da Força Expedicionária Brasileira, na Itália, em 1945, cumpre destacar seu papel heroico em defesa da liberdade, ao lutarem com bravura contra o socialismo, isto é, contra o nacional-socialismo, irmão siamês do socialismo real.

Aqueles que colocam a vida em risco no campo de batalha jamais agem com covardia diante dos riscos oferecidos pelos socialistas, implacáveis oponentes da liberdade.

A propósito daqueles que são favoráveis à investidura de socialistas, notórios e implacáveis corruptos, em elevadas instâncias da República, cumpre asseverar que eles não trocam 20 dias de glória por 20 anos de problemas com os adeptos do socialismo, contudo, fazem a opção por 20 anos de problemas para aqueles que defendem a liberdade.

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domingo, 1 de janeiro de 2023

Marambaia, militares e meio ambiente

"O lavrador perspicaz conhece o caminho do arado!"
Homenagem a Oscar Barboza Souto, antigo lavrador.
In Memoriam.

Revendo antiga papelada, surpreendi-me com uma matéria publicada no Jornal do Brasil, em 2003, quando eu chefiava o Campo de Provas da Marambaia (CPrM), no Rio de Janeiro, e as queridas filhas Alessandra, Laura e Cecília não tinham sequer completado o primeiro aninho de vida.

Resolvi incluir o texto, na íntegra, neste blog, à guisa de recordação de um tempo de expectativas otimistas e inequívocas realizações profissionais. Se infração legal existe na divulgação não autorizada, ela está ancorada em boas intenções, em boa causa e, portanto, é uma infração boa. 

Além da motivação resultante de a restinga da Marambaia, objeto do artigo, ser o habitat em que as queridas filhas passaram os 6 primeiros anos de suas vidas, o texto abriga declarações de oficiais que, àquela época, serviam comigo na primeira organização militar que comandei após a promoção a oficial-general. 

Assim, a matéria inclui declarações do chefe da Comunicação Social, coronel Cardoso; do tenente Francisco, meu auxiliar pessoal que, há 27 anos, como soldado, servira comigo, quando eu era primeiro tenente, na Companhia de Material Bélico Paraquedista; e da tenente dentista Daniela, que fora assaltada por dois marginais na estrada Burle Marx, via de acesso à restinga da Marambaia, e enfrentou com bravura momentos tormentosos. Cita ainda a tenente Eiras e a tenente Patrícia, esta médica pediatra que acompanhava Alessandra, Cecília e Laura, com desvelo e qualificação.

Que o relato de aspectos positivos, belos e engrandecedores formulado pelo jornalista Bruno Agostini — seria parente da Renata Agostini, que em 2018 fez extensa entrevista comigo, divulgada pelo Estadão? — sirvam de estímulo para que, neste primeiro dia de 2023, abriguemos nos corações e mentes as ideias de que mesmo uma tragédia política como a que começa hoje, com a investidura na Presidência da República de um ex-honesto, ex-corrupto, ex-condenado e ex-presidiário, não caracteriza o fim. 

Sempre há a possibilidade de um novo começo!

Sempre há uma causa justa a ser defendida!

Sempre há sendas escuras onde se pode espalhar luzes!

Sempre há desafios a demandar coragem!

Sempre há valores a serem mantidos com vontade e fé!

Sempre há uma Marambaia a nos impelir para a vanguarda objetivando a construção de um mundo melhor!

 

 

JORNAL DO BRASIL  Revista de Domingo  23 Nov 03

 


 

PELOTÃO NA GUARDA DA ECOLOGIA

 

O convívio pacífico de exercícios militares e natureza na Restinga da Marambaia

 

Bruno Agostini

 

 

Diariamente, rajadas de metralhadora, tiros de morteiro e canhões, lançamentos de foguetes e explosões de bombas compõem a rotina do Campo de Provas da Marambaia (CPrM), num paraíso ecológico praticamente intocado na Zona Oeste, a apenas 60 Km do Centro do Rio. Mas a área de 50 quilômetros quadrados, repleta de espécies animais e vegetais ameaçadas de extinção, não cumpre apenas funções militares. Um estrondo em forma de bromélias, orquídeas, sabiás-da-praia, quero-queros e até tartarugas-marinhas é ouvido mesmo a quilômetros dali, na Barra da Tijuca, por exemplo, onde florescem exemplares cuja germinação se deu a partir de sementes retiradas da restinga preservada. 

— Claro que os testes de armamento causam impacto ambiental. Mas ele é mínimo e a natureza se recupera em curtíssimo espaço de tempo – diz o diretor do campo de provas, general Ribeiro Souto, com a chancela dos biólogos que atuam no local. 

Se há 59 anos o lugar serve para experimentos de material bélico, há cerca de dez começaram pesquisas que asseguram a sobrevida de diversas espécies. Com a descaracterização do litoral carioca, restaram pouquíssimas áreas de restinga. A praia de 40 quilômetros de extensão monopoliza o imaginário quando se fala em Marambaia. Mas não são apenas as plantas pequenas e emaranhadas, típicas de restinga - podadas pela ação dos ventos que sopram constantemente -, que compõem a flora da reserva natural: 

— Quando se fala em Marambaia ninguém imagina florestas com árvores de até 28 metros de altura, formando bosques espetaculares, ou pensa nas 42 espécies de orquídeas que existem lá e só vivem em ambientes especiais – diz o pesquisador Luis Fernando Menezes. 

Não fosse o resguardo forçado pelas atividades das Armas, muitas espécies talvez não existissem mais. Uma das mais raras, a Eugenia copacabanensis (o nome indica que era achada em Copacabana quando foi registrada), é um desses exemplares. Assim como ela, mais de uma centena de variedades encontradas na restinga são reproduzidas no Bosque da Barra por funcionários da prefeitura. 

— As mais expressivas populações de diversas espécies de restinga estão na Marambaia, certamente. A Fundação Parques e Jardins não tem coletado sementes em outros lugares. Conseguimos reintroduzir várias que eram nativas da Barra com mudas que se desenvolveram a partir de sementes coletadas na Marambaia – comenta Luiz Roberto Zamith, biólogo com mestrado em ecologia, há cerca de dez anos trabalhando na fundação. 

Desde 1995 Zamith está à frente do projeto Flora do Litoral, da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, que já recompôs boa parte das áreas degradadas das Planícies de Jacarepaguá, aí incluídas as praias da Zona Oeste. Ele ainda utiliza o lugar para desenvolver estudos acadêmicos - há mais três teses em curso sendo produzidas no CPrM, além de uma dezena de pesquisadores atuando ali. A tese de doutorado de Zamith, também em ecologia, na UFRJ, é sobre Fatores que influenciam a sobrevivência e o crescimento de mudas de espécies nativas na restauração de restingas degradadas.

— É a perda de habitats a principal causa de extinção na atualidade. Dentro de uma metrópole, é uma dádiva contarmos com a restinga. O Exército inibe a caça e ação predatória de ladrões de plantas. Há uma imensa diversidade de fisionomias em um espaço relativamente pequeno. Sem contar que, com a especulação imobiliária, as áreas com certeza já teriam sido ocupadas. Como lá – afirma Luis Fernando Menezes, olhando para as encostas da Barra de Guaratiba, defronte, apinhadas de casas, mansões e casebres. 

Freqüentemente, Zanith e Luis Fernando são requisitados pelos militares para dar palestras aos alunos das diversas escolas que fazem visitas guiadas ao CPrM. 

— Temos a intenção de nos inteirar com a comunidade – conta o coronel Roberto Cardoso, relações-públicas da unidade. 

Mas, para isso, nem seria necessária a presença dos biólogos. Coronel Cardoso é um profundo conhecedor da fauna e flora da Marambaia e é capaz de discorrer sobre os hábitos do sabiá-da-praia tão bem quanto comandar a ordem-unida. Bromélias e cactus, comuns por lá, fuzilaram o coração do oficial, um apaixonado pelas plantas. Muitas vezes, o próprio Cardoso atende as crianças. 

Apenas 300 privilegiados militares e civis têm passe livre à Restinga da Marambaia. Alguns, ainda mais abonados, moram lá: são 48 famílias no total. 

— É realmente um privilégio. Olhamos para a frente e temos o mar com as águas mais limpas que já vi. Com todos aqueles bichinhos que não se encontram em outras áreas, como os tatuís. Isso sem falar no ar puro, na paz, no convívio com a natureza bruta, na área verde. Na verdade é melhor do que se possa imaginar. Nem tenho palavras para descrever a sensação de morar aqui – enumera o segundo-tenente Francisco, que vive numa das casas da vila, logo no início do CPrM. 

As paisagens encantadoras da Marambaia servem de cenários para filmes, novelas e comerciais. Kubanacan tem cenas gravadas ali, e a Globo prepara o terreno para iniciar as filmagens de Da cor do pecado – próxima novela das sete. O ex-presidente Fernado Henrique Cardoso gostava de passar festas de fim de ano na região. Para alívio dos militares lotados no CPrM, ele escolhia as instalações da Marinha, que ocupa a Ilha da Marambaia, na verdade a extensão final da restinga, mais ao Sul, intacta reserva de mata atlântica, de características físicas bem diferentes da restinga: 

— Presidente dentro de um quartel dá um trabalho danado. Graças a Deus, Fernando Henrique Cardoso ficava lá – graceja o coronel Cardoso, simpático. 

Apesar da imensa predominância masculina, há espaço também para as mulheres na Marambaia. As tenentes Eiras, Patrícia e Daniela dividem o tempo entre atendimentos médico-dentários, as armas e o computador. A loura Daniela Fagundes da Silveira, de 28 anos, nem precisaria ser dentista para deixar o pelotão de boca aberta. Vaidosa e bela, a oficial não dispensa o batom e o coturno bem engraxado. Musa do Exército? 

— Não tem essa história. Claro que acontecem brincadeiras, mas tudo dentro do maior respeito – desconversa a moça, ruborescida. 

Tenente Daniela caminhando na praia com um amigo.

E o paraíso não chega a ser inacessível. Ainda que o Exército restrinja o acesso à praia nos fins de semana a 250 pessoas – que devem estar cadastradas com carteirinha e tudo – tem gente, como o instrutor de mergulho Luiz Acioly, que promove passeios turísticos de barco pelo manguezal repleto de biguás, gaivotas e garças. E até mesmo exibicionistas tartarugas-marinhas que nadam abaixo da portaria do complexo militar nas águas verdes e límpidas do canal. Presença que já não causa alteração: 

— Elas estão aqui todos os dias, moram aqui. No início achava o máximo a presença das tartarugas. Agora já até enjoei – esnoba o sargento Gilberto Soares. 

E quais seriam as razões para o lugar seguir fechado ao grande público? 

— Só eu poderia lhe dar dez – diz Luis Fernando Menezes, para em seguida listar uma dezena de espécies seriamente ameaçadas de extinção que ali encontram seguro abrigo. De minúsculos lagartos, passando pela borboleta-da-praia, até chegar à rã Leptodactylus marambaie, dona deste nome por não ocorrer em mais nenhum outro lugar do mundo. 

Sem falar nas espécies vegetais como o oiti-do-mato, não incluídas na relação de razões do biólogo do Departamento de Botânica da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 

— O uso da praia na Marambaia deve ser controlado em função da manutenção da sobrevivência de diversas espécies de animais e plantas que só habitam este tipo de ambiente – completa Luis Fernando. 

Quem cresce o olho pensando em transformar o refúgio em complexo de lazer encontra sentinelas em alerta. 

— Ainda há gente que quer fazer daqui uma espécie de Cancun brasileira. Mas, se depender de nós, não vai acontecer mesmo – metralha o coronel Cardoso. 

 

Vizinhos têm problema ambiental

 

Duas pontes, lado a lado, separam a Restinga de Marambaia de Barra de Guaratiba. E estabelecem também a divisão de dois ambientes completamente distintos. De um lado, natureza virgem. Do outro, encostas ocupadas, problemas de saneamento e vias de sustento que minguam a cada ano. 

Mas uma queixa é comum tanto à turma das armas quanto à das redes: a pesca de arrasto, que é proibida e gera enorme desperdício de peixes: 

— Quando passam aqui, a praia fica cheia de peixes mortos que não são aproveitados. O pior é que não podemos fazer nada, é função do Ibama – reclama o coronel Cardoso, apontando uma dupla de barcos que pratica a pesca predatória em frente à Praia da Marambaia. 

O mais velho pescador da região, Célio Soares, de 82 anos, recebe o mais novo, Ronan Soares, de 14, que acabara de chegar da pescaria: 

— Esse aí está se formando pescador, mas se não tomarem uma providência logo ele não vai ter como trabalhar – lamenta Célio ao ver o garoto chegar com a raquítica produção do dia: alguns siris e poucos pampos e bagres. 

Outrora abundante, a pesca de camarões, caranguejos, trilhas, corvinas, sardinhas e ostras em Guaratiba fica comprometida com o tráfego de barcos pesqueiros que infringem as leis. 

— Deveria haver apenas pesca artesanal aqui. O pessoal de fora está acabando com o nosso peixe – manifesta-se Manoel Fogaça, dono do Bar do Xodó, ponto de encontro dos pescadores de Guaratiba, entre as praias Grande e do Canto, com nobre vista sobre o oceano. 

Ao contrário das queixas em uníssono contra a pesca de arrasto, a restrição ao acesso à Marambaia divide: 

— Não sei por que não abrem a praia ao público – reclama Jorge Monteiro, que tem um restaurante no caminho para a restinga. A mulher dele rebate: 

— Não tem que abrir nada. Para quê? Para destruírem tudo? Deixe como está – brada Carmelita de Souza, que prepara as peixadas do restaurante Tia Carmelita no fogão a lenha. 

Deliciosas, diga-se. E baratas. Uma porção de badejo para três pessoas sai por R$ 18. Pode ser o complemento perfeito para um passeio em Barra de Guaratiba, que além da praia abre a possibilidade de um tour pelo mangue. Luiz Acioly, dono de um barco de sete pés, cobra R$ 20 por pessoa para percorrer, por uma hora e meia, igarapés e águas do manguezal: 

— Dá para observar uma série de aves, como o mão-pelada, uma espécie de arara azul típica de mangues, vários tipos de caranguejo e tartarugas que vão ali desovar – comenta Acioly, também instrutor de mergulho. 

Bom programa de fim de semana. Turismo para carioca, em pleno Rio. 

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sábado, 31 de dezembro de 2022

A casa, a escola e o rio

"O lavrador perspicaz conhece o caminho do arado."
Homenagem a Oscar Barboza Souto, antigo lavrador.
In Memoriam.

Em 2014, visitei Rochedo-MS e apresentei à querida família uma parcela de minha trajetória, vivenciada nos distantes idos de 1956 a 1960, compreendendo as seguintes vertentes: 

– a casa em que morei, contígua a estabelecimento comercial;

– a escola em que estudei o curso primário; e

– o rio no qual quase me afoguei.

A casa. Em 1956, meu saudoso pai, Oscar Barboza Souto, saiu da fazenda do sogro — onde morou nos primeiros 12 anos de casamento com minha mãe, Alaide — e mudou-se para Rochedo. Nesse povoado, antes das núpcias em 1944, fora um dos pioneiros nas artes do garimpo. 

A despeito da exígua cultura formal — na infância, frequentara apenas 3 meses de escola —, nessa nova vivência rochedense, foi nomeado cartorário (Tabelião do Registro Civil). 

Em 1957, Oscar comprou do Elias Daige uma casa que, além de moradia, abrigava comércio decadente. Esse estabelecimento pertencera anteriormente ao comerciante e fazendeiro Issa Nahas.

Após a demissão do cargo de Tabelião, que exerceu durante cerca de 4 anos, Oscar se tornou Juiz de Paz; subsequentemente, vice-presidente do Partido Social Democrático e, em circunstâncias eventuais, presidente do partido. Nessa condição, exibia com orgulho a foto tirada na convenção do PSD, em Cuiabá, ao lado do Presidente Juscelino Kubstchek e do Senador Filinto Müller.

A família morou nessa casa durante mais de 20 anos. Nela, Oscar deu prosseguimento à criação dos filhos. O minguado comércio inicial foi transformado em um dos maiores estabelecimentos comerciais de Rochedo, com a venda de secos e molhados; tecidos, calçados, confecções e armarinhos; ferragens e outros utensílios domésticos; e até mesmo combustíveis, tendo montado o arremedo do primeiro posto de gasolina da cidade — essa caracterização se deve ao fato de que inicialmente era apenas uma bomba manual de processamento de combustível, que, com a chegada da energia, foi substituída por bomba elétrica.

A casa foi pois a fonte de inspiração e de recursos para que Oscar encaminhasse o processo educacional dos cinco filhos. Todos ingressaram em Faculdade. Aléssio obteve graduação em Ciências Militares na AMAN, em Resende-RJ, e graduação em Engenharia, bem como Mestrado no IME, na cidade do Rio de Janeiro — no Exército, ascendeu ao posto de General de Divisão; Angeliqui concluiu Pedagogia em Campo Grande e se tornou supervisora educacional; Aloizio realizou o curso de Advocacia em Dourados, e se tornou delegado de polícia estadual; Agton começou Pedagogia e Direito, e Edna começou Pedagogia, mas ambos não concluíram os cursos e se tornaram contabilistas.

A relevância dessa casa para Oscar, Alaide e seus filhos, é inequívoca e guarda reminiscências afetivas e profissionais inexcedíveis.

Laura, papai Aléssio, Alessandra e Cecília.
Casa na rua Dr. Arnaldo de Figueiredo, s/nº. Abrigou a família de Oscar Barboza Souto, no período de 1956 a 1993. Pertecera a Issa Nahas, que a transferiu para Elias Daige. Este, por seu turno, vendeu-a em 1956 para Oscar.

A escola. Primeiramente, cumpre destacar a arquitetura da fachada, com o ano de origem, 1934, grafado no alto da parede frontal. Fica a dúvida: será que se trata do ano em que foi concebido o projeto ou o ano de construção da edificação? 

A resposta a essa indagação é irrelevante. Cumpre ressaltar a visão dos administradores daquela época. Eles cravaram em um local afastado das virtudes civilizacionais o marco, não raro ignorado, da prioridade e prevalência da Educação para a construção da grandeza humana.

Destarte, urge mencionar que vários jovens, que se tornaram engenheiros, administradores, advogados, militares de nível superior e professores, fizeram o antigo curso primário nessa saudosa escola. É incrível constatar que o ensino era de nível tal, que pessoas de origem humilde, de uma região com pouco contato com centros minimamente desenvolvidos, pudessem dar o pontapé inicial do processo educacional em estrutura tão modesta; algo que na atualidade, com tantos avanços sociais e econômicos, nem sempre é possível.

Dúvida não resta de que a imagem dessa velha escola continua na fronteira da consciência daqueles que tiveram a ventura de trafegar por seus bancos e, especialmente, aqueles que lograram êxito e conquistaram a condição de profissional de nível superior.

Trigêmeas Cecília, Alessandra e Laura.
Pioneira escola construída em 1934; e substituída, em 1973, pela nova Escola Estadual José Alves Ribeiro. A velha e saudosa escola é adequada para abrigar um museu. As antigas e beneficiadas gerações demandam esse presente fundamental para a história e cultura rochedenses.

O rio. As águas ora quase claras ora barrentas, em decorrência do período chuvoso, do rio Aquidauana, exerceram impacto em corações e mentes. Aprender a nadar, atravessar o rio, saltar das pedras ou de frondosas árvores, brincar e até mesmo brigar em suas margens, enfim encarar os riscos inerentes, eram desafios que as crianças e os adolescentes precisavam ser capazes de enfrentar. E aqueles que fugiam da encrenca eram objeto de brincadeiras, de escárnio e de críticas mordazes dos demais — sofriam pois o que hoje se chama pejorativamente de “bullying”.

 

 

Jamais esquecerei que, na quadra dos 7 anos, papai ainda morava na fazenda do vovô e me colocou na pensão da Dª Isabel, em Rochedo, para estudar. Seguindo a tendência dominante, fui para a beira do rio e naturalmente aventurei-me a enfrentá-lo. Comecei a afogar e aí surgiu o anjo salvador: o filho do ‘seu’ Afonso de Araújo Passos, diretor da escola, mergulhou e me tirou da água. 

Quando meu pai soube, prometeu-me uma surra memorável. Por óbvio, não precisava; deveria aprender a nadar, a partir da parte rasa e tranquila — mais tarde, tive êxito. O rio não era virtuoso nem traiçoeiro; os desavisados é que eram vítimas da falta de bom senso.

 

 Levantar-se ao alvorecer, ir à escola na parte da manhã e, à tarde, após o futebol — cujo campo, desafortunadamente, algum administrador destruiu mais da metade para construção de edificações — passar uma boa hora nas águas não tão serenas do rio era fonte de fortalecimento físico e emocional.

Cecília, Laura e Alessandra; Isabel; Alessandra e Aléssio.
O rio Aquidauana nasce na serra de Maracaju (município de São Gabriel do Oeste) e percorre uma extensão de 620 quilômetros até juntar-se ao rio Miranda a cem quilômetros de sua foz no rio Paraguai. Passa pelas seguintes localidades: Fala-Verdade, Baianópolis, Corguinho, Rochedo e a cidade de Aquidauana.

Sonho bom. Essas lembranças — afora a satisfação de me conferir a modesta condição de cronista bissexto — me levam de volta ao passado, sensibilizam e emocionam. Então, permito-me asseverar o seguinte:

   na casa em que morei, contígua ao estabelecimento comercial, ainda criança, aprendi a relevância da família e do trabalho;

   na escola em que estudei o curso primário, tive a percepção do impacto do conhecimento na vida do ser humano; e

   no rio no qual quase me afoguei, aprendi a nadar e valorizar o mérito da superação do infortúnio.

Por isso, dividir esses sentimentos com minha esposa e nossas queridas trigêmeas envolveu-me em alegria e enlevo. Passados alguns anos de nossa visita, rememorar é sonhar o sonho bom, é viver agradavelmente cada momento inesquecível.

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domingo, 25 de dezembro de 2022

Amado, Saramago e Sartre

"O lavrador perspicaz conhece o caminho do arado."
Homenagem a Oscar Barboza Souto, antigo lavrador.
In Memoriam.

Na obra “Encontro de Escritores — Uma reunião inesquecível”, os ‘scholars’ Francisco Gomes de Amorim e Henrique Salles da Fonseca, cuidam de desvendar possíveis assuntos que são tratados em magistral reunião de escritores de língua portuguesa de vários países e de várias épocas, em fictício retorno às plagas terrenas. Entre outros, estão incluídos Camões, Alexandre Herculano, Antero de Quental, Machado de Assis, Gilberto Freyre, Guimarães Rosa e Ariano Suassuna. Na visão dos autores:

“Para além da fama como escritores o que levam os literatos desta vida? E o que falam entre eles?

Eis o que ensaiam os autores deste pequeno livro.

Tratando-se de gente culta e educada, uma coisa é certa: nenhum fala da sua própria obra, mas apenas do que aprendeu com os outros.”

Foram deixados de fora do livro, aqueles que, por infelizes opção e vocação, abrigam em suas mentes o ideário socialista. Cabe então cogitar como seria a participação de três integrantes dessa grei — Jorge Amado, José Saramago e Jean-Paul Sartre; este, francês, para confirmar que toda regra pode ter exceção. Tentar é desafiador. A seguir, é apresentada uma modesta provocação atinente a esses personagens não incluídos na magnífica obra de Amorim e Fonseca.

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A trindade socialista finalmente deu as caras. Conquanto aparentemente tranquilos, Saramago, Amado e Sartre arrastavam-se sem ocultar o peso da consciência dilapidada. Dirigiram-se para uma mesa em que as taças de vinho ainda estavam intocadas. O diálogo entre Saramago e Amado é surpreendente e esclarecedor.

— Estimado Jorge, no passado,  no livro “Entre Quatro Paredes” (“Huis Clos”),  o Jean-Paul colocou no inferno três personagens para purgarem os vícios cometidos na trajetória terrena, quando cada um achava que “o inferno são os outros” (l’enfer c’est les autres”). Similarmente, deixamos nossa eternidade e, aqui retornamos, para purgar as contradições, os desvios político-ideológicos e a mácula da moralidade e da ética, contidos em nossa forma de pensar e agir.

— É bem verdade, José. E nesse sentido, foi estabelecido que o Jean-Paul deve permanecer calado por ter declarado que “somos condenados a ser livres”, mas venera o sistema onde as pessoas são condenadas a viver sem liberdade; e por não se ter sensibilizado com a divulgação dos crimes de Stalin, por Kruschev, no XXº. Congresso do PCUS. Ademais, a despeito de sua expectativa por uma taça de vinho, ele está impedido dessa facilidade francesa; ele só pode ingerir vodca, que pode ser servida agora, ... ou não!

— E você meu caro Jorge, vai ter que renunciar àquela mulata baiana que está lhe esperando na recepção deste conclave. Em nosso purgatório particular, você está impedido de seguir para a Bahia acompanhado pelo espécimen de imprescindível seio desnudo — por seus próprios vícios e também porque o povo baiano está sujeito ao desastre de uma administração socialista. Só lhe resta uma vantagem: você está impedido de confirmar, in loco, o desastre de quem se propõe a abraçar o socialismo.

— É bem verdade, José! Consolo-me em saber que não estou sozinho nessa expiação. Você, por seu turno, não poderá encontrar-se com sua filha Violante e sua última esposa Pilar del Rio (presentes na recepção deste conclave), e seguir para a vila de Azinhaga, onde você nasceu, e onde seria homenageado pela gente da província Golegã. É uma pena, dado que não poderá constatar que, de fato, “o ideal de vida é ser uma árvore”, como você bem afirmara, porém se o socialismo prevalecesse em suas plagas de origem, ele desertificaria o ambiente e assim o ideal de vida passaria a ser um deserto.

— Sim. Mas pelo menos não vivenciamos a tragédia do Jean-Paul que produziu “A Idade da Razão” (“L’Age de Raison”), porém em sua trajetória, tendo abraçado o socialismo, abdicou sistematicamente do uso da razão. Mas mudando de assunto, mestre Amado, considerando que sou um ganhador do prêmio Nobel de Literatura, você não acha que eu deveria pleitear um alívio nas medidas que esses irreconhecíveis patrícios lusitanos estão nos impondo?

— Veja bem, José, os cidadãos do mundo estão vivenciando uma questão paradoxal. Eles devem fazer a opção pelo supostamente grande José Saramago ou pelo inequivocamente grande Boris Pasternak? Como assim? Você me perguntaria. Você ganhou o prêmio Nobel por sua obra literária “Ensaio sobre a Cegueira”relato de uma epidemia torturante que aflige os seres humanos; à qual tem semelhança com a tortura resultante da atuação dos adeptos do socialismo que você venera cegamente. Já o Boris Pasternak também foi premiado com o Nobel de Literatura, exatamente porque, com sua monumental obra “Dr. Jivago”, ele realizou robusta e contundente denúncia contra os absurdos do socialismo.


Nesse instante, achegam-se integrantes da comissão organizadora do conclave para entregar o roteiro das próximas etapas do processo. A segunda etapa da purgação que começaria em breve, consistia na terrível sina de que os três malsinados passariam a ficar eternamente mudos. Um dos portadores da informação aduziu que a terceira e última etapa estava ainda em discussão. As opiniões estavam divididas; havia gente pró e outros contra. A proposta inicial era cortar as mãos dos três socialistas para que não pudessem mais escrever e, subsequentemente, eliminar do cérebro a faculdade de pensar, de tal sorte que a moléstia intelectual e moral que portavam deixasse de ser contagiosa; e não mais se espalhasse por mentes desavisadas.

— Afável Jorge, é imperioso que arquitetemos uma solução para impedir essa tragédia. Por acaso, não lhe ocorre alguma ideia. Por pior que sejam as nossas, não custa tentar algo. Afinal, sonhos e milagres existem. Basta que os procuremos.

— José, José Saramago! Talvez o Brasil tenha a solução milagrosa. E se nós renunciarmos a nossos ideários, denunciarmos o assassinato de cem milhões de cidadãos no mundo pelo socialismo e ... — embora não haja cadeiras, a gente precisaria se sentar para não ter um AVC! — e se nós propusermos a eliminação, antes de 1º de janeiro de 2023, das faculdades de pensar e agir dos lulo-petistas brasileiros, com a renúncia automática a qualquer cargo público eletivo ou não?

— Brilhante solução, Jorge (tão Amado)! Mas falta apenas resolver a questão daquele careca. Bom, é fácil! Um tiro na testa contraria os direitos humanos, sendo pois inaceitável, contudo, foi concebido um raio laser com o diâmetro tão diminuto que, se destinado à parte central do cérebro não tem consequência vital, o paciente sobrevive normalmente, porém se torna tão útil quanto qualquer vegetal. Então, chamemos os integrantes da comissão organizadora.

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Por óbvio, o venerável Francisco Amorim não admitiria a inclusão deste texto adicional. Macular a obra não é preciso. Simples assim! Ele jamais quebraria a leveza e a elegância de seu magnífico opúsculo, concebidas com inexcedíveis criatividade e talento. 

Demonstrar que ‘o inferno é o socialismo dos outros’ (‘l’enfer c’est le socialisme des autres’) pode ser objeto de outras obras.

 

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Problemas brasileiros cruciais

Diante da análise cuidadosa da atual conjuntura, formulada por um fraterno companheiro, com ênfase para as notícias eivadas de falsidade ou ...