"O lavrador perspicaz conhece o caminho do arado." Homenagem a Oscar Barboza Souto, antigo lavrador. In Memoriam. |
Discurso da oradora da turma, Alessandra Rocha Ribeiro Souto, na formatura de encerramento do Ensino Médio no C. E. Leonardo da Vinci, em 05/12/2021.
De forma tardia, porém oportuna, incluo-o neste meu blog, para que a reflexão não cesse, jamais!
Uma dúvida: será que meu modesto meio de expressão está a altura de conceitos, ideias e proposições tão relevantes?
Uma certeza: meu ambiente de pensar e propor restará enriquecido com a excelência da lição de minha querida filha.
Senhores educadores, caros colegas, em nome de quem expresso minha saudação também a todas as autoridades, familiares e demais convidados
Boa noite a todos,
Eu gostaria de agradecer a oportunidade de representar os alunos. É uma honra gigantesca, um sonho e um privilégio imensurável. Aproveitando a deixa, nós não podemos esquecer: é um enorme privilégio poder estar aqui e ter a oportunidade de estudar em uma escola como o Leonardo da Vinci.
É fato que o colégio tem falhas, nenhuma instituição é isenta de críticas, nem de reparo – essa é inclusive a inesgotável tentativa humana, a do aperfeiçoamento –, mas uma coisa é certa: prá além de uma sólida formação acadêmica, o Leonardo nos proporcionou formação humana, e, ouso dizer, [capacidade de] reflexão crítica. Isso é perceptível ao se observar o nosso currículo, a excelência que é exigida dos profissionais e os eventos promovidos pela escola. E nada disso seria possível sem aqueles que, de fato, fazem o colégio acontecer e existir, enquanto instituição burocrática, mas também ente vivo, em constante transformação e evolução.
É preciso agradecer, então, à equipe administrativa da escola. Foram eles os responsáveis por tornar real o sonho da educação, com a administração de todo o aparato que faz essa gigantesca máquina funcionar. É preciso agradecer também à equipe técnico-pedagógica, pelo trabalho fantástico que ela desempenha em prol da escola, dos alunos, dos professores, de manter a ordem em um grupo tão plural e diverso, e por isso mesmo tão caótico e inesperado. Foram essas pessoas que atuaram como mediadoras, organizadoras e, muitas vezes, mais que isso, amigas, e até mesmo como pais e mães dos alunos. Eles são os responsáveis por esse sistema exemplar de gestão de emergências, pedagogia e disciplina. Muito obrigada. Um muito obrigado também aos trabalhadores que mantêm a estrutura física da escola prá nós, a limpeza e a alimentação, a manutenção técnica e virtual, a guarda dos portões e corredores. A atuação de cada membro é essencial pra que o corpo escolar trabalhe em busca da homeostase, da coesão. É a interdependência dos integrantes que nos define como grupo e mostra que cada pequena fração é essencial pro todo, como estudamos na solidariedade orgânica de Durkheim, no 1º. ano [Émile Durkheim foi um psicólogo e sociólogo francês, considerado o fundador da sociologia, pelo fato de ter sido o primeiro a criar um método sociológico que distinguiu a sociologia das demais ciências humanas.]
Aproveitando esse conceito, chegamos aos nossos tão queridos professores. Existe um poema de Cora Coralina, em que ela faz uma adaptação de um trecho bíblico, já no primeiro verso: “Professor, sois o sal da terra e a luz do mundo.” Pensar nisso é de uma beleza poética inexcedível, e de uma grandiosidade existencial também: o mundo só não está cheio de despovoados por causa de vocês, diletos professores, já que toda a luz é também guia, e vocês nos guiam sempre. A capacidade de modificação e de atuação de vocês na vida dos alunos é monumental. São vocês que edificam o ser humano, do alicerce até o topo: é a vocês que é conferida a função de libertar. A condição humana plena depende, portanto, da existência de vocês. O falecido líder sul africano Nelson Mandela possui a conhecida frase de que “a educação é a arma mais poderosa que se pode usar para mudar o mundo.” Cá estão vocês, munidos de nada menos que a possibilidade da viabilização do conhecimento, e é isto, e unicamente isto, que tem o mais radical poder de transformação da realidade. Obrigada por serem corajosos e dispostos a transformar. Eu peço desculpas por falar disto esta noite, mas, professores, saibam que, quando a Indesejada das gentes chegar prá cada um, apenas aquilo que havia de mortal em vocês se terá ido, porque vocês continuarão vivos, imortais e infinitos em todos nós que fomos seus alunos.
Por fim (finalmente!) agora, somos nós, os que, como meu pai costuma falar, fazem a escola. Os alunos. Talvez nós tenhamos acabado de vivenciar o período mais mágico da nossa vida e, por bem ou por mal, a escola foi enorme parte disso. Anos tão confusos quanto os da adolescência, tão intensos, tão agridoces. Pensar em tudo que a gente viveu nesse colégio... a agitação de entrar numa sala desconhecida, como aluno novo, sem nenhum amigo; a ansiedade de apresentar um trabalho na frente da sala inteira; a felicidade de esperar pela aula preferida da semana; a diversão das conversas e da bagunça do fundão; a tristeza em chorar no banheiro ou levar seu amigo com você pra desabafar lá; os flertes no corredor com o “crush” da outra sala; a vergonha de cair na escada na frente de todo mundo na saída; a euforia de fazer o seu primeiro discurso na ONUVinci, como é denominada a exemplar simulação de eventos da ONU pelos alunos do Leonardo da Vinci; a animação com a chegada da OliVinci [a olimpíada esportiva anual] e a loucura de ganhar com sua turma; a curiosidade por trás do primeiro dia no laboratório; o nervosismo de fazer o primeiro simulado; a celebração em poder usar calça jeans e uniformes do ensino médio; a raiva também passada em tantos momentos; o alívio do último dia de provas; a emoção que era ver as fantasias do “terceirão” [denominação extraoficial do 3º ano do ensino médio] enquanto a gente ainda era do sexto ano e torcer pra algum dia ser como eles...
E agora olhar prá trás e ver que tudo isso já passou não mais que de repente, e que nós não só nos tornamos eles, o “terceirão”, mas também já passamos disso, já nos tornamos adultos, formados, sem mais escola e esses fenômenos que eu acabei de contar. É uma sensação devastadora, nostálgica, mas muito feliz também. A nossa vida aconteceu e foi construída no Leonardo — [envolvendo] todas as nossas metamorfoses. Apesar dessa transição tão séria, é preciso que nós nunca deixemos os nossos sonhos de quando éramos crianças morrerem.
A grandeza da juventude, que é a importância de se enxergar relevante pro mundo, constitui a nossa essência que se constrói enquanto ainda somos jovens. Sim, porque apesar de todos estarmos formando no mesmo ponto e termos influências em comum ao nosso redor, a nossa reação, o nosso enfrentamento e o nosso poder de realização fazem a diferença e criam uma vivência única prá cada um, de tal sorte que a autenticidade do ser é elevada ao máximo. E nós nos encontramos aqui celebrando tudo que aprendemos, percorremos e alcançamos, encerrando essa jornada estupenda, e indo agora em direção um novo e desafiador caminho que nos aguarda – o do próprio mundo.
É necessário, é imperioso que esse mundo seja um lugar melhor depois de nós, como resultado de nosso pensamento e de nossas ações. Como futuros professores, artistas, cientistas, ativistas, todos nós podemos mudar o mundo. É graças ao que a escola nos possibilitou que nós vamos ser os criadores e transformadores da Terra, não mais presos ao nosso microcosmo ou a nossa realidade, mas podendo alcançar limites muito além. Nós temos, por conta disso, a responsabilidade pelo mundo, não apenas pelo dever de fazer dele um lugar melhor, mas pela necessidade de fazê-lo assim. Claro, temos que agradecer aos professores e profissionais do colégio porque é devido a eles que nós temos vários e novos modos de mudar esse mundo, e chance extremamente prolíficas. Nós temos de continuar estudando, trabalhando e fazendo o nosso melhor, por eles e por nós, sem desistir ou deixar de tentar. Por um único motivo: porque a frase proferida por Stephen Hawking “Não importa quanto a vida possa ser ruim, sempre existe algo que você pode fazer, e triunfar. Enquanto há vida, há esperança.” é algo que desde sempre os nossos professores tentaram nos mostrar.
Assim, cada um de nós, com seus esforços para chegar até aqui e passar prá uma etapa tão importante da vida, ratifica a ideia de que a vida escolar e o aluno são muito mais que suas notas. As emoções vividas, a determinação, a coletividade e a união mantêm o que somos e nos guia para o que nos tornaremos, para o que desejamos ser e para o descobrimento de qual é a nossa função nesse mundo tão vasto. É com base nessa tentativa vitalista “camusiana” de determinarmos nós mesmos as rédeas da nossa amplidão que eu friso a importância de nos mantermos jovens, porque é assim que nós vamos transformar. Que nunca percamos, portanto, essa essência do estudante, do jovem idealista, romântico e inovador que quer transformar o mundo.
Eu vou sentir muita a falta de vocês, nós tivemos um tempo maravilhoso juntos. Uma menção honrosa aqui para Laura, Cecília [as irmãs] que me apoiam sempre, e prá meu pai e minha mãe, que também o fazem e viabilizaram as condições para que eu estivesse aqui. Obrigada por não deixarem de acreditar em mim. Muito obrigada a todos!
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