sexta-feira, 17 de junho de 2022

China — Riscos e desafios - II

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China – Riscos e desafios - I

Com grande ostentação, nesta sexta-feira, 17 de junho de 2022, a China lançou ao mar o seu primeiro super porta-aviões, o Fujian. Trata-se da belonave mais poderosa já construída fora dos Estados Unidos. O regime comunista chinês está mostrando suas garras, numa clara demonstração de força diante da dramaticidade da guerra russo-ucraniana e no âmbito do que está sendo denominada a Guerra Fria 2.0. É o terceiro porta-aviões chinês colocado à disposição de suas forças armadas e o primeiro de categoria similar à dos gigantes americanos.

Os Estados Unidos dispõem de 11 porta-aviões e agora estão secundados pela China, que planeja lançar o quarto em breve, sendo que há indicações de que este disporá de propulsão nuclear.

Os seguintes aspectos estratégicos que compõem o pano de fundo dessa nova Guerra Fria adquirem relevância nesta conjuntura:

– Pequim projeta uma frota com mais de 5 porta-aviões para fazer face à prioridade de dominar seu entorno estratégico imediato como o estreito de Taiwan e o mar do Sul da China;

– em contraposição ao Ocidente que aplica severas sanções contra Moscou por causa da invasão da Ucrânia, a China ofereceu decisivo apoio ao governo de Wladimir Putin;

– diante da assertividade chinesa, os Estados Unidos ativaram uma rede de aliados no Indo-Pacífico, o que de certa forma estimulou a China a acelerar seu programa de expansão e modernização de suas forças armadas, aí incluído o desenvolvimento dos mísseis hipersônicos — a grande opção militar atual, notadamente dos Estados Unidos, Rússia e da própria China;

– dentre os países fabricantes de porta-aviões, a China já ocupa lugar de destaque:

 

     País            Quantidade      Tonelagem      Aeronaves

     —————————————————————————

     Estados Unidos     11             100 mil      80

     China                      3               59 mil      30

     Rússia                     2               58 mil      30

     Reino Unido           2               65 mil      40

     Índia                        1               45 mil      30

     França                     1               42 mil      40

     —————————————————————————

     Fonte: Jane’s Magazine.

 

Nesse contexto, urge recordar ações chinesas antecedentes que permitem avaliar os riscos e desafios atinentes à interação com a cultura chinesa.

Na década de 1930, a China enviou Qia Xuesen para os Estados Unidos, com o objetivo de fazer mestrado e doutorado. Após o doutorado, Xuesen permaneceu trabalhando nos Estados Unidos e foi um dos proponentes do primeiro laboratório de jato propulsão do mundo — o Jet Propulsion Lab (JPL). Em 1945, ao final da Segunda Guerra Mundial e em face de seu reconhecido talento, Xuesen foi comissionado coronel do Exército americano, para entrevistar os cientistas nazistas. Ele foi pego transmitindo o conhecimento auferido para a China e, em consequência, perdeu o posto militar e foi preso. Em 1953, ao término da Guerra da Coreia, foi libertado em troca de prisioneiros entres americanos e chineses. Xuesen retornou para a China, tornou-se diretor de uma das principais organizações de Pesquisa & Desenvolvimento e Ciência & Tecnologia chinesa. Dessa forma, ele liderou a implantação do programa espacial chinês e do programa de desenvolvimento de mísseis intercontinentais, dentre os quais umas duas centenas estão apontados para os Estados Unidos.

Em 1949, após a vitória da Revolução Chinesa, Mao Tse Tung se dirigiu a Moscou para interagir com Stalin e acertar a cooperação russo-chinesa subsequente. Os acordos foram amplos e abrangiam, entre outros, os campos político, científico-tecnológico e militar. Em face do lançamento das bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki, no próximo Japão, aos chineses interessavam o desenvolvimento nuclear. Por essa razão, um dos pontos do acordo militar envolvia a produção de bomba atômica. Mao obteve de Stalin a promessa de fornecimento de uma bomba de urânio para explosão experimental e obtenção imediata de dados que poderiam levar até uma década de estudos convencionais. Em 1958, Krushev foi a Pequim e diante da cobrança do fornecimento do artefato nuclear, negou-se a cumprir o acordo. Então, os chineses riram. Eles empreenderam um projeto nuclear paralelo secreto, com efetividade potencializada pela interação com os russos. Em consequência, os chineses obtiveram sua bomba atômica de fissão (com urânio ou plutônio) e, em seguida, obtiveram a bomba de fusão (com hidrogênio) — centenas de vezes mais potente do que a de fissão. Enfatize-se que dentre os países que detém esses dois tipos de artefatos nucleares — Estados Unidos, antiga URSS, França, Inglaterra e China — os chineses levaram menos tempo para passar da bomba de plutônio (ou urânio) para a de hidrogênio.

Os dados atuais relativos à evolução econômica (em que se constata que a economia chinesa está próxima da dimensão da economia americana) e ao desenvolvimento de tecnologia militar e ampliação do poder bélico, associados com os alicerces de conduta estratégica do passado, conferem à China uma condição privilegiada para o exercício de liderança regional ou mundial. Ademais, a interação com os chineses se constitui em desafio e mesmo risco, especialmente, pela consciência de grandeza que norteia as abordagens e empreendimentos políticos e estratégicos chineses.

A China encontra no Brasil ambiente e materialização de suas demandas básicas, que podem ser sintetizadas em base territorial (por meio da compra de propriedades), a demanda por alimentos (absolutamente requeridos por uma bilionária população) e a consequente necessidade de infraestrutura (para a satisfação das necessidades prementes).

Nesse contexto, a concessão por parte de governadores de Estado de vantagens para os chineses, especialmente nos três campos mais relevantes (alimentos, propriedades rurais e infraestrutura) revelam atitude e abordagem plena de desqualificação estratégica e ignorância no sentido de que as autoridades brasileiras devem estar atentas e agirem no sentido de preservar os elevados interesses brasileiros em qualquer interação, associação ou negociação com os chineses.

 

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